quinta-feira, 2 de maio de 2013
O carinho pelos animais de estimação
Donos de animais de estimação costumam ser acusados de dedicar-lhes um amor excessivo, por tratá-los como filhos. Isso é considerado um obsceno deslocamento de afetos. Tendo a discordar: quem quer filhos tem filhos, cães e gatos geralmente ocupam outro lugar.
Talvez a melhor representação disso esteja na concepção de Dimons que encontramos em Fronteiras do Universo, uma trilogia que se inicia com A Bússola de Ouro, do britânico Philip Pullman. Estes são uma duplicação das personagens, sua "alma de estimação". Na história, cada humano tem um Dimonou Daemon, sua extensão animal, como se a alma caminhasse a seu lado e ainda fosse possível dialogar com ela. O de Lyra, a personagem principal, chama-se Pantalaimon e pode assumir várias formas conforme a necessidade: mariposa, gato-do-mato, morcego. Quando ela crescer, sua personalidade tendo atingido uma forma mais definida, o mesmo ocorrerá com ele, que assumirá uma identidade estável, sua melhor tradução.
Oriundo da mágica Oxford, Pullman conseguiu dar corpo novo a um recorrente aspecto do mundo mítico: nossas metamorfoses como animal. Em muitas sociedades antigas, os animais eram pensados como seres de outra cultura, não como natureza. Imputam-lhes linguagem e credos, assim como atributos mágicos específicos a cada espécie. Conservamos algo dessa visão mágica, por isso o animal se presta para metaforizar o caráter e predicados que supomos ter.
É dessa ordem a relação que estabelecemos com nossos animais de estimação, cujo maior mérito é estimar o dono. Se são tratados como filhos, o são somente num aspecto da parentalidade, aquele no qual o filho é uma extensão do narcisismo dos pais.
O excesso de zelo com os animais de estimação parece ridículo aos que estão fora da cena. Mas, quando problemas de saúde os afetam, seus donos apresentam um genuíno sofrimento, que aprendi a jamais subestimar. Da mesma forma, a morte de um animal de estimação arrasta consigo uma parte de nós.
Por essa função de duplo que o animal ocupa, comemoro quando um paciente passa a estimar um para chamar de seu. Relacionar-se com essa criatura é uma experiência amorosa que funciona melhor que muitos antidepressivos. Não tem contraindicações, além de ser bom descobrir a cara de nosso Dimon. O meu é um buldogue francês ancião, cujos olhos enormes e dóceis mascaram uma natureza insubordinada. Meu número.
Com informações do site Vida Simples.
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